Para encerrar de forma especial a semana em homenagem ao Dia Internacional da Mulher, conversamos com Lia Baptista Carvalho, a liderança feminina por trás da Rede Cruzada.
Durante o bate papo, Lia compartilhou momentos de sua trajetória, falou sobre o seu papel como presidente da Rede Cruzada e a importância do terceiro setor para a sociedade atual.
Quem é essa mulher por trás da Rede Cruzada?
Formada em psicologia, com especialização em Terapia de Família, durante anos geriu o próprio consultório, manteve um instituto de formação, presidiu congressos importantes da área e hoje, aos 76 anos, acaba de ingressar em um curso online de Mobilização de Conselhos, na Harvard Kennedy School.
“Eu sou uma estudante permanente. Estou estudando sempre. Porque eu acho que ajuda a minha cabeça, a enfrentar o dia a dia, me ajuda a não parar os neurônios e porque, acima de tudo, eu sou curiosa.” ressalta Lia.
Somando a esta rotina, a eterna estudante desempenha também o seu papel como esposa e matriarca de uma família de três filhos que a inspiram todos os dias.
Como foi assumir a liderança da Rede Cruzada e quais foram os principais desafios?
Lia sempre teve uma relação muito próxima com a organização, sendo parte do conselho e presidente algumas vezes na história da Rede Cruzada. A última e mais recente, ocorreu por volta de 2012.
Na época, em 2011, a cidade São José do Vale do Rio Preto, onde a família de Lia tinha uma fazenda, sofreu uma grande enchente que deixou muitas pessoas desabrigadas e em situação de extrema vulnerabilidade. A Rede Cruzada rapidamente arrecadou muitas doações emergenciais e inaugurou um grande centro de capacitação na cidade, que em parceria com Sesi, Senai, Sebrae e Senac, formou mais de mil pessoas para trabalhar na reconstrução de São José do Vale do Rio Preto. Nesse contexto, Lia assumia a presidência da Rede Cruzada.
“Eu entrei de cabeça. E só quando assumi a Rede Cruzada é que vi o tamanho do desafio que era gerir aquilo tudo. Não era só conduzir um projeto. Era cuidar de todas as decisões. Da parte financeira, administrativa, do marketing, enfim, tudo! A partir daí passei a conhecer a Rede Cruzada de forma mais profunda, entendendo todo o operacional. ”, lembra.
Em 2012, a organização inaugurou também a CEI Daschú, que funciona até hoje e já beneficiou centenas de pessoas. O Centro de Educação Infantil entrou para a família que já contava com a Casa Emilien Lacay, Plantando o Amanhã, creche Tio Beto e centenas de colaboradores. Focada e determinada, Lia, se envolveu inteiramente e descobriu sua habilidade como gestora, que segundo ela, sempre esteve ali, só precisava de um empurrãozinho para florescer.
“E assim eu descobri a Lia líder, que podia liderar vários segmentos. Quando eu precisei ser líder, eu fui. E tive que aprender muita coisa, inclusive a interpretar uma planilha.” reforça.
Ao ser questionada em como se sente colaborando para as transformações sociais, afirma com transparência e humildade que ela é a maior beneficiada.
“A minha gratidão é por ter tido, e ter até hoje, a oportunidade de participar desta organização, da qual eu tenho o maior orgulho. Eu acho meio piegas achar que eu faço o bem. Eu gosto de dizer que eu ajudo as pessoas a pensar e a refletir com as minhas perguntas.” afirma.
O que move e inspira a Lia?
Ao refletir sobre a sua liderança feminina e motivações, Lia diz
“Se você quer mudar alguma coisa, mude você. Não espere que o outro mude. Pois, quando você muda, você consegue mudar os outros. É dessa forma que eu tenho vivido ao longo desses 76 anos a minha experiência como mulher”
Sempre contando com o apoio dos filhos e netos, a matriarca se mostra orgulhosa da coragem que teve, e tem até hoje, de enfrentar os desafios da vida. Para ela, “se tornar um ser humano melhor, é um exercício diário”
Quando o assunto é pessoas que a inspiram, Lia cita a sua mãe, seu marido, seus filhos e netos. Segundo ela, eles a ensinam coisas novas todos os dias. Além da família, são muitas as referências de pensadores tais como o professor e escritor Yuval Harari que aparece em destaque na lista. Mas, é da maneira mais prática, bem ao seu estilo, que Lia resume: “as pessoas que me inspiram são todas aquelas que me fazem pensar fora da caixa.”
Quais são as expectativas para o futuro?
A Rede Cruzada vive, assim como o mundo, um momento desafiador. Com a pandemia de COVID-19, a organização se viu obrigada a fechar as suas unidades. Mas, as atividades continuaram remotamente durante todo o tempo e como Lia faz questão de reforçar:
“Nós mantivemos o nosso maior patrimônio vivo: a capacidade de se relacionar com as famílias”.
Ela também elogia a gestão do atual presidente Rodrigo Capistrano e do gerente geral, Renato Senna, que segundo ela, foi crucial para que a organização conseguisse manter o equilíbrio durante esse período de incertezas.
Mas novas preocupações começam a surgir no horizonte. Entre elas, o elevado número de jovens que sem acesso à tecnologia se afastam dos estudos.
“Me preocupa muito esse cenário. Tem muito jovem desistindo de estudar. E cada vez que ele desiste, ele vai ficando fora do mundo. Serão os inúteis que o Harari tanto fala”, afirma fazendo menção a teoria do professor, Yuval Noah Harari, que fala de “uma nova classe de pessoas que deve surgir até 2050: a dos inúteis. Pessoas que não estarão apenas desempregadas, mas que não serão empregáveis.”
A Rede Cruzada vem refletindo, estudando possibilidades, revendo seu propósito, metodologia, e Lia acredita que essa será a grande inovação da organização para a próxima década.
Cheia de vida e de histórias, Lia encerra o bate papo em homenagem ao Dia Internacional da Mulher deixando claro que essa mulher de 76 anos, assim como a organização social da qual faz parte, está sempre se reinventando e provocando mudanças nas pessoas que a cercam.
“Essa é a Lia, sempre se motivando, se movimentando e se reinventando. Gosto de olhar para as pessoas e enxergar o que elas tem de bom para me oferecer e me inspirar.”